O MEU CAMINHAR
Já havia avançado tanto, que já não me dava conta das minhas idéias, tal o vazio que se encontrava em minha cabeça, pois elas, as idéias, estavam por aí meio desordenadas.
O caminho, sempre buscando às ladeiras. Deixando de ser de barro colorido, visto que, de vez em quando, o sol lhe dispõe em forma e cores diferentes, se cobriu de uma areia branca e fina, que molhada ou seca era igual. Por esses fatos eu tinha a certeza de logo toparia com o oceano; conhecia muito bem o cheiro das algas e o de caca de gaivotas, embora, tenha estranhado não haver escutado primeiro o estalido das ondas contra os arrecifes.
Mas estava ali. Observei as primeiras casas em uma completa desordem de formas e cores, ainda que, todas dispostas no caminho, o que por fim acabava. Senti-me muito cansado e faminto. Não reparei que algumas crianças se divertiam, e não vi que eles estavam atirando bolas de areia em uma vaca, que se encontrava assustada no canto de um curral; feito de tábuas e troncos.
Falei a uma mulher que vigiava o curso da vida sentada em uma poltrona de madeira no terreiro em frente da casa e à sombra de uma laranjeira – Pensei, quem sabe quantos anos levaria sentada ali mesmo...
- Senhora! Qual é a casa mais luxuosa deste povoado?
Ela meditou – sua resposta demorou muito, mais do que o esperado. Temi que não me houvesse percebido, porque não me olhou em nenhum momento.
- Parece-me que pode ser a mansão do Sr. Raul Aguilar. (Respondeu-me finalmente) Está há três quadras para lá e mais duas abaixo. A reconhecerá, porque há trepadeiras adornando o teto.
- E que mais tem, senhora - Lhe perguntei, vivamente interessado.
- Veja o senhor que jamais hei sabido o que pode ter lá dentro! Que coisas terão lá, vai uma como eu saber?
Nada mais soube me dizer. Observei, ao que devia ser, seu marido passeando por ali com um porrete, assim que o vi, pensei - melhor me ir. Interar-me do assunto dos jardins, bastou, para saber que ali encontraria todo o que desejava. Quando há jardins bem cuidados há, também, comida bem preparada e servida como corresponde; pratos de porcelanas e taças de cristal para o vinho, cobertas de linho bordadas; roupa limpa e bem passada – tudo isso.
Toquei varias vezes a campainha, e me respondiam do interior nada mais que uns cachorros furiosos. Realmente caiam do teto ramos de flores coloridas. Momentos depois uma empregada da casa me atendeu através do portão de ferro semi-aberto.
- Sim, o que o senhor deseja?
- Desejo falar com Sr. Raul Aguilar, disse com voz serena, entretanto firme.
- Quem deseja?
- Eu, diga-lhe, por favor, que sou eu...
Notei algo de receio em sua expressão, ainda assim, se foi de volta ao interior da casa em busca de uma resposta. Neste ínterim, também, observei, que alguns metros mais adiante em todas as janelas do casarão estava, o mar. Não pude contemplá-lo muito minuciosamente; mas vi que não era de um azul profundo como o de minha terra, más de um tom esmeralda e cheio de praias por todos os lados, inclusive mar adentro, devido às muitas ilhotas. Eu diria que parecia com um grande pântano esverdeado.
Com a cara voltada para o mar me pegou o Sr. Raul Aguilar – homem de meia idade, gordo, mas de braços fracos.
- Diga - me disse ele.
- É o senhor, o Sr. Raul Aguilar?
- Sim.
- Olhe, senhor Aguilar – lhe expliquei, hei me interado que sua casa é a que melhor oferece condições neste povoado, ademais, é uma casa que demonstra o bom gosto de seus donos... O Sr. Aguilar cruzou os braços, muito intrigado com o meu discurso. Eu venho cansado de uma longa viagem – prossegui; tão longa que já não me recordo de donde venho nem por que venho. E mais, nem sé para onde vou ou nem por que vou. Talvez não deveria ter vindo nunca... Pode ser também eu não esteja aqui nem o senhor esteja aí me escutando. Mas, na realidade, o fato é que me sinto cansado de comer carne dura com arroz empastado, cansado de dormir sob as arvores, cansado de ver as estrelas sempre no mesmo lugar. Por tudo isso é que solicito que me brinde todas as comodidades de sua casa pelo que resta deste dia e até amanhã, somente até amanhã, pois muito cedo verei uma maneira de cruzar o oceano para alcançar o outro continente, para alcançar em definitivo o que o senhor no poderá ver jamais... Porque entre tanta penúria hei de ter esse privilegio – Sou eu o que vê o que, todavia, no há... Compreende-me?
- Olhe senhor errante – me disse. Tem o senhor muita sorte. Hoje estive lendo algo a respeito dos artistas, assim que lhe entendo. Quiçá amanhã me houvesse esquecido de todo aquilo e aí, o expulsava a ponta-pé de minha casa.
- Bom, senhor Aguilar... Disse-lhe.
- Entre...
- Eu dormirei nas dependências de serviço.
- Por favor, ocupe o que desejar.
- Tomei meu fardo e adentrei ao antejardim...
Um caminho de pedras sobre uma gramínea recém cortada conduzia à entrada principal. Por mais que me sentisse aliviado, resisti em agradecer-lhe.
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